sexta-feira, 13 de julho de 2007

Será o Benedito?

Pois bem, o Papa Bento XVI resolveu dar um freio de arrumação no amontoado de denominações e siglas religiosas nascidas ou inspiradas nos evangelhos de Cristo. Afirmou nada menos que a “única Igreja plena” era a Católica de Roma e que “dialogar com outras denominações religiosas não significava reconhecê-las como tal”. E aí, o que era para arrumar, terminou desarrumando tutti per tutti. Se existe um produto bem em falta nos supermercados do pensamento e da convivência entre os povos é exatamente este: o da tolerância, o da aceitação da rica diversidade humana.

Não demorou muito para que a cristandade católica sentisse uma saudade infinda dos antecessores no Trono de Pedro, dentre estes, os de saudosíssima memória João XXIII e João Paulo II. O primeiro através do Concílio Vaticano II fez uma revolução na prática católica da religiosidade: aboliu as missas em latim, aboliu que os padres as celebrassem de costas para a audiência, falou da necessidade de se interagir com todos os credos, demonstrou preocupação com a parte mais vulnerável da humanidade (pobres, indígenas, campesinos, latinos, afro-descendentes, asiáticos etc) e simplificou uma série de ritos. Até o uso da batina por parte dos padres foi tratado de forma secundária. O segundo e mais recente Papa, viajou mundo afora, beijou terras nunca dantes pisadas por alguém alcunhado de Sua Santidade, esteve na China e em Cuba, na Alemanha e na Polônia, e só no Brasil, três vezes. Abriu o diálogo marcroecumênico não apenas com as igrejas cristãs do Leste como também do Oeste e aí se incluem as Igrejas Ortodoxas da Rússia, da Armênia, de Istambul. E avançou a passos largos para lançar pontes de entendimento com judeus, bahá´ís, hindus, muçulmanos, budistas, zoroastrianos.

Na recente visita ao Brasil, há poucos meses, Bento XVI conversou com o presidente Lula da Silva. Pelo que a imprensa repercutiu, quatro pedidos de Sua Santidade foram negados: (1) Que os padres no território nacional fossem isentos de recolhimento de contribuições previdenciárias, carteira assinada, fundo de garantia e outras “regalias” de nossa tradição trabalhista; (2) Que os missionários católicos tivessem acesso irrestrito às terras indígenas e (3) Que autoridades eclesiásticas católicas obtivessem do Itamaraty passaporte diplomático e, por último, mas não menos importante, pediu ao presidente que condenasse abertamente o uso de preservativos masculinos – as famosas camisinhas, gola rolê. O presidente não deixou nada para ser estudado depois, negou os quatro pedidos. Com isso ficou de todo claro que fez o dever de casa: estar atento ao brieffing que lhe é passado antes de encontrar-se com qualquer Chefe de Estado – no caso específico, destaque-se, Bento XVI é o Chefe do Estado do Vaticano, além de líder máximo da cristandade católica apostólica romana. A argumentação de Lula da Silva resplandecia como o sol a pino (aquele sol que geralmente ao meio-dia fica mais incandescente e brilhante): “o Brasil é um país laico, onde Estado e Igreja estão, constitucionalmente, separados.”

Agora, imaginemos que o presidente tivesse atendido os quatro pedidos, ou apenas um, dois ou três destes. Quais seriam as conseqüências imediatas? Não precisa ser nenhum Stephen Hawking para prever a onda de protestos das demais denominações religiosas exigindo o mesmo tratamento dado à religião de Sua Santidade. Afinal, o que o Rabinato da Congregação Judaica do Rio de Janeiro tem a menos que a Cúria Metropolitana de São Paulo? O que a herdeira do terreiro de Menininha do Gantois, na Bahia, tem a menos que a Arquidiocese de Salvador?

Imaginemos também um padre, devotado ao longo de decênios, de ¼, 2/4 ou de ½ século a evangelizar as almas, de repente, alcança seus 75, 80 anos de ininterrupta atividade pastoral, quais seriam suas garantias materiais e financeiras para usufruir o restinho de sua velhice? Seria colocado em algum seminário, asilo, convento e dependeria da boa vontade dos demais? Não. Fez muito bem o presidente Lula afirmar que nessa terra descoberta por Cabral, neste limiar da primeira década do século XXI, “a lei é igual para todos”. E quando falamos todos isso quer dizer que “ninguém é mais igual que ninguém”.

Em seu breve pontificado Bento XVI escreveu encíclicas, publicou livros, aboliu o limbo (aquele lugar onde as almas penadas costumam ficar papeando e expressando angústia de para onde irão depois dali), elevou aos altares novos santos, inclusive o brasileiríssimo Frei Galvão, mas também gerou muita polêmica, sobretudo, quanto ao direito de exclusividade da Igreja Católica de servir como o único link a ligar a criatura ao Criatura, o único caminho para a salvação espiritual.

Bento e Benedito são sinônimos se assim podemos dizer. É tanto que em alguns países Sua Santidade é Benedito XVI e não Bento XVI.

Cabe, então, a pergunta: Será o Benedito?
Texto: Tom Araújo - da equipe do PP
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Um comentário:

André Halo disse...

Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e sol e o luar,
Então acredito nele,
Então acredito nele a toda a hora,
E a minha vida é toda uma oração e uma missa,
E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.
Mas se Deus é as árvores e as flores
E os montes e o luar e o sol,
Para que lhe chamo eu Deus?
Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar;
Porque, se ele se fez, para eu o ver,
Sol e luar e flores e árvores e montes,
Se ele me aparece como sendo árvores e montes
E luar e sol e flores,
É que ele quer que eu o conheça
Como árvores e montes e flores e luar e sol.
E por isso eu obedeço-lhe,
(Que mais sei eu de Deus que Deus de si próprio?),
Obedeço-lhe a viver, espontaneamente,
Como quem abre os olhos e vê,
E chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes,
E amo-o sem pensar nele,
E penso-o vendo e ouvindo,
E ando com ele a toda a hora.
(Alberto Caieiro - FP)

Tô com o Seu Alberto e não abro!

Ótimo texto, Tom, valeu!